PRESENÇA

É preciso que a saudade

desenhe tuas linhas perfeitas,

teu perfil exato e que,

apenas, levemente,

o vento das horas ponha

um frêmito em teus cabelos...

É preciso que a tua

ausência trescalesutilmente,

no ar, a trevo machucado,

as folhas de alecrim desde

há muito guardadasnão se sabe

por quem nalgum móvel antigo...

Mas é preciso, também,

que seja como abrir uma janela

e respirar-te, azul e luminosa, no ar.

É preciso a saudade para eu sentir

como sinto - em mim -

a presença misteriosa da vida...

Mas quando surges és tão outra

e múltipla e imprevista que nunca

te pareces com o teu retrato...

E eu tenho de fechar meus olhos para ver-te.

(Mário Quintana)

Saudade


Saudade é solidão acompanhada,

é quando o amor ainda não foi embora,

mas o amado já... Saudade é amar um

passado que ainda não passou,

é recusar um presente que nos machuca,

é não ver o futuro que nos convida...

Saudade é sentir que existe

o que não existe mais...

Saudade é o inferno dos que perderam,

é a dor dos que ficaram para trás,

é o gosto de morte na boca dos que continuam...

Só uma pessoa no mundo deseja

sentir saudade: aquela que nunca amou.

E esse é o maior dos sofrimentos:

não ter por quem sentir saudades,

passar pela vida e não viver.

O maior dos sofrimentos é nunca ter sofrido.

(Pablo Neruda)



(...) Eu sou feito de estrelas derretidas,

e sangue do infinito.

Com meu toque descubro as

várias coresdos âmagos dormidos.

Vou ferido de místicas miradas,

e carrego os suspiros efervescendo

em sangues invisíveis até o sereno

triunfodo imorredouro amor pleno de Noite.

Conhecem-me as crianças,

e me coalho em tristezas.

Em contos de castelos e rainhas sou corola de luz.

Sou incensáriode cantos desprendidos

que caíram envoltos em azuis

transparências de ritmo.

Em minh'alma perderam-se

solenescarne e alma de Cristo,

e finjo entardeceres de tristeza,

melancólico e frio.

O bosque inumerável.

Conduzo as caravelas de

meus sonhos para o desconhecido.

Guardo esta amargura solitáriade

não saber meu fim nem meu destino. (...)

(García Lorca)