"Pois que ele era uma pessoa e ela outra,
descobriu de repente, afastando as cortinas.
E eu que quis fazer de mim algo tão claro como um
rio sem profundidade, disse para si mesma,
em distração colocando em movimento os átomos de poeira.
Curvou-se até o chão para apanhar um grampo.
Quando se curvava assim, o cabelo caindo no rosto,
assumia um ar humilde de coisa grande que se curva.
Ela era toda grande, de mãos e pés e olhos e busto,
mas um grande que não se impunha, não feria.
Um grande que pousava como quem já vai embora.
Ela parecia levantar vôo, no surpreendente de que ao
elevar-se não deslocasse o ar em torno nem provocasse ventania.
Até mesmo seu coração era grande.
Era coração, aquele escondido pedaço de ser
onde fica guardado o que se sente e o que
se pensa sobre as pessoas das quais se gosta?
Devia ser. Para tornar mais fácil o desenrolar do pensamento,
ela concordava. E argumentava de si para si,
lembrando músicas e poetas vagamente vulgares
que falavam em coração: pois se alguém fazia
uma música ou um poema forçosamente devia
ser mais inteligente do que ela, que nunca fizera nada.
Alguém mais inteligente certamente saberia o
lugar exato onde ficam guardadas essas coisas.
Coração, então, repetiu para si, consumando a descoberta."
*Trecho do conto "Coração de Alzira", de Caio Fernando Abreu*
Concordo con te, l'amore è per tutta la vita! Un abbraccio...ciao
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