Canção na plenitude

 
Canção na plenitude
 Não tenho mais os olhos de menina
 nem corpo adolescente, e a pele
 translúcida há muito se manchou.
 Há rugas onde havia sedas, sou uma estrutura
 agrandada pelos anos e o peso dos fardos
 bons ou ruins.
 (Carreguei muitos com gosto e alguns com rebeldia.)
 O que te posso dar é mais que tudo
 o que perdi: dou-te os meus ganhos.
 A maturidade que consegue rir
 quando em outros tempos choraria,
 busca te agradar
 quando antigamente quereria
 apenas ser amada.
 Posso dar-te muito mais do que beleza
 e juventude agora: esses dourados anos
 me ensinaram a amar melhor, com mais paciência
 e não menos ardor, a entender-te
 se precisas, a aguardar-te quando vais,
 a dar-te regaço de amante e colo de amiga,
 e sobretudo força — que vem do aprendizado.
 Isso posso te dar: um mar antigo e confiável
 cujas marés — mesmo se fogem — retornam,
 cujas correntes ocultas não levam destroços
 mas o sonho interminável das sereias.
 
 *Lya Luft*

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